SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
MANDADO Nº: 5.418 UF: DF
RELATOR: Min. Demócrito Reinaldo
DATA: 25.3.98
FONTE: D. J. de 01.6.98
ASSUNTO:
Princípio da vinculação ao instrumento convocatório - Excesso de formalismo - Desnecessário rigor prejudicial ao interesse público.
EMENTA:
Direito público - Mandado de segurança - Procedimento licitatório - Vinculação ao edital - Interpretação das cláusulas do instrumento convocatório pelo judiciário, fixando-se o sentido e o alcance de cada uma delas e escoimando exigências desnecessárias e de excessivo rigor prejudiciais ao interesse público - Possibilidade - Cabimento do mandado de segurança para esse fim - Deferimento.
O Edital, no sistema jurídico-constitucional vigente, constituindo lei entre as partes, é norma fundamental da concorrência, cujo objetivo é determinar o objeto da licitação, discriminar os direitos e obrigações dos intervenientes e o Poder Público e disciplinar o procedimento adequado ao estudo e julgamento das propostas.
Consoante ensinam os juristas, o princípio da vinculação ao Edital não é absoluto, de tal forma que impeça o Judiciário de interpretar-lhe, buscando-lhe o sentido e a compreensão e escoimando-o de cláusulas desnecessárias ou que extrapolem os ditames da lei de regência e cujo excessivo rigor possa afastar, da concorrência, possíveis proponentes, ou que o transmude de um instrumento de defesa do interesse público em conjunto de regras prejudiciais ao que, com ele, objetiva a Administração.
O procedimento licitatório é um conjunto de atos sucessivos, realizados na forma e nos prazos preconizados na lei; ultimada (ou ultrapassada) uma fase, preclusa fica a anterior, sendo defeso, à Administração, exigir, na (fase) subseqüente, documentos ou providências pertinentes àquela já superada. Se assim não fosse, avanços e recuos mediante a exigência de atos impertinentes a serem praticados pelos licitantes em momento inadequado, postergariam indefinidamente o procedimento e acarretariam manifesta insegurança aos que dele participam.
O seguro garantia a que a lei se refere (art. 31, III) tem o viso de demonstrar a existência de um mínimo de capacidade econômico-financeira do licitante para efeito de participação no certame e sua comprovação condiz com a fase de habilitação. Uma vez considerada habilitada a proponente, com o preenchimento desse requisito (qualificação econômico-financeira), descabe à Administração, em fase posterior, reexaminar a presença de pressupostos dizentes a etapa em relação à qual se operou a preclusão.
O Edital, in casu, só determina, aos proponentes, decorrido certo lapso de tempo, a porfiar, em tempo côngruo, pela prorrogação das propostas (subitem 6.7); acaso pretendesse a revalidação de toda a documentação conectada à proposta inicial, tê-lo-ia expressado com clareza, mesmo porque, não só o seguro-garantia, como inúmeros outros documentos têm prazo de validade.
No procedimento, é juridicamente possível a juntada de documento meramente explicativo e complementar de outro preexistente ou para efeito de produzir contra-prova e demonstração do equívoco do que foi decidido pela Administração, sem a quebra de princípios legais ou constitucionais.
O valor da proposta grafado somente em algarismos - sem a indicação por extenso - constitui mera irregularidade de que não resultou prejuízo, insuficiente, por si só, para desclassificar o licitante. A ratio legis que obriga, aos participantes, a oferecerem propostas claras, é tão só a de propiciar o entendimento à Administração e aos administrados. Se o valor da proposta, na hipótese, foi perfeitamente compreendido, em sua inteireza, pela Comissão Especial (e que se presume de alto nível intelectual e técnico), a ponto de, ao primeiro exame, classificar o Consórcio impetrante, a ausência de consignação da quantia por extenso constitui mera imperfeição, balda que não influenciou na decisão do órgão julgador (Comissão Especial) que teve a idéia e percepção precisa e indiscutível do quantum oferecido.
O formalismo no procedimento licitatório não significa que se possa desclassificar propostas eivadas de simples omissões ou defeitos irrelevantes.
Segurança concedida. Voto vencido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, decide a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, conceder a segurança, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, vencido o Sr. Ministro ARI PARGENDLER que a denegava, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Votaram com o Sr. Ministro Relator os Srs. Ministros MILTON LUIZ PEREIRA, ADHEMAR MACIEL, JOSÉ DELGADO, GARCIA VIEIRA e HÉLIO MOSIMANN. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS. Custas, como de lei.
Brasília (DF), 25 de março de 1998 (data do julgamento).
PEÇANHA MARTINS
Presidente
DEMÓCRITO REINALDO
Relator
Entusiasta da Administração Pública, Petrônio Gonçalves, Economista pós-graduado, Militar aposentado, Pregoeiro com mais de 20 anos na área, facilitador da Escola Nacional de Administração Pública (ENAP) e do Centro de Formação do Servidor Público do Est. de PE (CEFOSPE), fomenta neste blog as discussões sobre a matéria. Com súmulas, decisões e acórdãos do TCU, e textos de juristas, (© Copyright 10/11/12/13/14/15/16/17/18/19/20 Tribunal de Contas da União; dos Juristas/Autores/p. Editor).
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